sexta-feira, 20 de setembro de 2013

OS MITOS DO “IMPÉRIO DO BEM” E AS LIÇÕES DA HISTÓRIA


A reação ao artigo de Vladimir Putin publicado no jornal americano The New York Times superou todas as expectativas. “A América não é excepcional por fazer o bem. Ela faz o bem por ser excecional” – esta é, resumida, a lógica irrefutável de muitos comentários indignados. Na sua mensagem aos norte-americanos, o líder russo escreveu que Moscou e Washington devem regular em conjunto a situação na Síria. Mas, por qualquer razão, foi o último parágrafo que irritou a maioria do seu público-alvo. Neste Putin apenas recordava à liderança dos EUA uma das disposições da sua própria Declaração de Independência, a qual afirma que todos os homens são iguais perante Deus. Também o senador John McCain não deixou de reagir. Tal como prometeu, ele publicou a sua resposta ao presidente russo.

Barack Obama recordou a excepcionalidade dos EUA no fim do seu discurso à nação, quando o líder norte-americano tentou garantir o apoio dos eleitores a um possível ataque à Síria. A referência à “excepcionalidade” não provocou nenhuma reação especial por parte dos seus ouvintes, exceto talvez de alguém mais sentimental que tenha vertido uma lágrima ao ouvir falar mais uma vez da “missão especial” da América.

A polêmica teve início depois de o presidente Vladimir Putin ter acentuado esse conceito no seu artigo. “É muito perigoso inspirar as pessoas a sentirem-se excepcionais, sejam quais forem as intenções. Há países grandes e pequenos, ricos e pobres, os que têm profundas tradições democráticas e os que ainda procuram o seu caminho para a democracia. A sua política também é diferente. Nós somos todos diferentes, mas quando pedimos que Deus nos abençoe não nos devemos esquecer que Deus nos criou iguais”, escreveu o presidente russo.

Mas afinal se verificou que a América está realmente convencida da sua excepcionalidade e que agora lhe “pisaram nos calos”. A maioria dos políticos, e a mídia na sua esteira, irrompeu em reprimendas iradas. Afinal toda a História nos ensina que uma América forte é a fonte do Bem no mundo. Nenhum país libertou mais pessoas e fez tanto para elevar o nível de vida – também em todo o mundo. E é claro que os Estados Unidos continuam a ser o “farol da esperança” para as pessoas – de todo o mundo, naturalmente.

Sim, é verdade que a História ensina, mas só aqueles que querem aprender e não os que querem adaptá-la às suas necessidades, sublinha a perita da Academia Russa de Serviço Público Kira Sazonova:

“A História demonstra que os países que escolheram a via da sua especificidade, o que é perfeitamente normal, mas precisamente a via da excepcionalidade, acabavam na via do expansionismo e da agressão externa. Têm visão os políticos que percebem que os tempos da expansão e da excepcionalidade, se ainda não passaram completamente, já estão passando. Hoje o protagonismo é de um princípio completamente diferente – o da cooperação. É por isso que o artigo de Vladimir Putin veio mesmo a propósito para recordar que o princípio da cooperação é fundamental para o direito internacional moderno.”

Aliás, o próprio Barack Obama é um refém do mito americano. Durante a sua campanha eleitoral o candidato a presidente defendia um ponto de vista algo diferente. Na altura Obama afirmava que acreditava na excepcionalidade americana, mas que esta em nada era diferente da “excepcionalidade britânica”, da “excepcionalidade grega” ou de qualquer enaltecimento patriótico idêntico de qualquer outro país. O candidato foi então bastante criticado e por isso mudou rapidamente de discurso.

As raízes dessa ilusão inocente que vivem os cidadãos dos EUA remontam aos tempos dos primeiros colonos. A ideia de “excepcionalidade” obteve depois um novo fôlego nos anos de 1980 com Ronald Reagan. Ele falava da América como de “uma cidade luminosa no cume de um monte” e estava convencido que ela era um exemplo único da vitória da liberdade e da esperança. Já nos últimos 20 anos, com o desmoronamento da URSS, a “singularidade” dos EUA já não podia ser contrariada por ninguém, refere o vice-diretor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos Vilen Ivanov:

“A liderança dos Estados Unidos e a elite americana acreditaram na sua excepcionalidade porque o mundo se tornou unipolar e os EUA se tornaram no país mais poderoso no plano econômico e militar. Por outro lado, a experiência histórica não de todo tida em conta. A Alemanha hitleriana, nomeadamente: o nacional-socialismo, que com Hitler ascendeu ao poder, propagandeava precisamente essa excepcionalidade do povo alemão com todos os seus meios. Isso acabou por levar a Alemanha a sofrer a derrota e a ficar manchada perante todo o mundo por ter permitido que essa camarilha chegasse ao poder.”

Realmente, a seu tempo o famigerado doutor Goebbels introduziu com sucesso nas mentes dos alemães o conceito da sua excepcionalidade e da sua superioridade. Aliás, também na América muitos avisam a liderança do perigo dessa ideologia. Assim, Daniel Ellsberg, conhecido por ter, numa certa altura, divulgado documentos secretos do Pentágono, publicou recentemente um artigo nas páginas do The Guardian. Segundo Ellsberg, “os EUA são agora um Estado policial”. Na sua opinião, para que aí se estabeleça uma ditadura completa só é necessária “uma guerra… ou mais um atentado terrorista com a dimensão do 11 de setembro”. Enquanto que as recentes denúncias do antigo colaborador da NSA Edward Snowden, conclui Ellsberg, só ajudam a salvar os americanos.

Ainda mais direto foi, nas suas declarações, o ex-candidato à presidência dos EUA e republicano Ron Paul. Ele está convencido que a liderança dos EUA se está afastando dos princípios de uma verdadeira república e está evoluindo para a formação de um sistema fascista, em que o país é liderado em conjunto pelos políticos e pelos maiores homens de negócios.

O artigo de Vladimir Putin não podia, é claro, deixar indiferente um “fã” tão especial da Rússia como é o senador John McCain. Tal como prometeu, ele respondeu ao líder russo com o seu artigo que o jornal Pravda publicou no dia 19 de setembro. Eis o seu teor resumido: McCain afinal não é anti-russo, mas sim pró-russo e por isso está muito preocupado com o martirizado povo russo que tem de sofrer horrores como o Caso Magnitsky, as perseguições das Pussy Riot, a discriminação dos homossexuais e a amizade das autoridades com “regimes ditatoriais”.

Uma lista estandardizada que demonstra, mais uma vez, a fé de McCain pelo menos na sua própria excepcionalidade. O presidente da Rússia, ao se dirigir ao povo americano, não começou a ensiná-lo como se deve viver nos EUA, mas já o senador americano sabe, com toda a certeza, como devem viver os russos e até está disposto a oferecer-lhes esses valores liberais já amanhã, mas Putin não deixa.

Talvez a maioria dos habitantes dos EUA terão dificuldade em acreditar, mas o resto do mundo vê a singularidade americana de forma algo diferente. Do ponto de vista dos não-americanos, essa excepcionalidade se manifesta no bombardeamento de países que têm no poder regimes incômodos para Washington, nas revoluções coloridas, na Primavera Árabe e na ingerência despudorada e “correção do rumo” de países soberanos. As palavras de Obama no seu último discurso foram precisamente uma clara ilustração da integridade americana. “Se com um pequeno esforço e com uma pequena dose de risco nós pudermos evitar a morte de crianças pelo gás, garantindo dessa forma a segurança a longo prazo dos nossos próprios filhos, então acho que devemos fazê-lo”, disse o presidente dos EUA.

O pequeno esforço são umas centenas de mísseis Tomahawk. Evitar a morte de crianças pelo gás: depois de um ataque com mísseis dificilmente ficará alguém capaz de respirar o gás. Se bem que não se trata das crianças sírias, mas das perspectivas das crianças “excepcionais” americanas.

Fonte: Voz da Rússia

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