Embora tenha se concentrado no que classifica como um agravamento da situação da segurança pública no Brasil, a Anistia Internacional reservou, em seu relatório anual, preocupação especial com a situação da comunidade LGBT no país.
A edição de 2015 do "Estado dos Direitos Humanos no Mundo", divulgada nesta quarta-feira, critica o que, no entender da ONG, é uma intensificação da pressão e política e religiosa contra homossexuais. O relatório cita estatísticas, compiladas pela ONG Grupo Gay da Bahia, de que 312 pessoas foram mortas em crimes de ódio homofóbicos ou transfóbicos no Brasil em 2013.
Para Maurício Santoro, assessor de direitos humanos da Anistia no Brasil, os número não apenas são críveis como podem estar subestimados.
'Estereótipos'
"No Brasil há a dificuldade em se classificar crimes homofóbicos, pelo fato de que muitas vítimas e suas famílias não denunciam. Mas o fato de se poder falar que houve quase um homícidio homofóbico por dia em 2013 é grave mesmo diante das estatísticas mais gerais de crimes no Brasil", afirma Santoro, em entrevista à BBC Brasil.
A ONG expressou preocupação com o posicionamento público de figuras políticas e religiosas no Brasil em relação aos direitos da comunidade de LGBT, sobretudo o de autoridades com grande visibilidade, como congressistas.
"É preocupante quando esses grupos conseguem bloquear avanços na legislação que ofereça mais proteção. O Brasil teve avanços, mas eles ocorreram nos tribunais", completa Santoro.
A Anistia acredita que o número de 312 homicídios homofóbicos no Brasil em 2013 é subestimado
O relatório cita explicitamente o veto a um projeto do governo federal de distribuir material educacional em direitos humanos nas escolas, como parte de uma campanha de conscientização sobre discriminações, como um exemplo negativo da pressão político-religiosa.
"Batalhas políticas impedem avanços que incluem a educação, que é uma medida preventiva contra a discriminação".
A Anistia também vê o lobby afetando significantemente a discussão sobre o aborto no Brasil. E alerta que a pressão para a criminalização da prática é um risco para mulheres por causa do aumento pela demanda por serviços clandestinos. O relatório cita o caso de Jandira dos Santos Cruz e Elisângela Barbosa, que morreram depois de fazer abortos clandestinos no Rio de Janeiro.
"Esses casos chocantes foram importantes para desafiar os estereótipos sobre o aborto. Eram mães de família que foram forçadas a tomar soluções mais drásticas por causa da lógica proibicionista".
'Contramão'
As tentativas de criminalização total do aborto despertam preocupação na Anistia
Houve preocupação específica com os casos em que as normas de atendimento humanizado e sigiloso em socorro às sequelas de abortos clandestinos foram quebradas por médicos que denunciaram suas pacientes à polícia - na semana passada, uma jovem de 19 anos foi presa em São Bernardo do Campo, em São Paulo.
"É preocupante o fato de este caso não ter sido isolado e que haja pressão política e religiosa por uma criminalização total do aborto, o que vai totalmente na contramão de um debate que há 40 e 50 anos já se teve na Europa e nos Estados Unidos", observa Santoro.
Em termos mais gerais, a ONG criticou a atuação das forças policiais brasileiras na repressão de protestos relacionados à Copa das Confederações e à Copa do Mundo, em 2013 e 2014. A Anistia também citou as estatísticas da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo de que mais de 30 jornalistas foram agredidos durante a cobertura de manifestações no período do Mundial.
O capítulo do Brasil no anuário também contém críticas à violações generalizadas de direitos humanos pelos órgãos de segurança pública, como mortes pela polícia e denúncias de tortura e maus-tratos no sistema penitenciário.
Fonte: BBC Brasil
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