Há um incêndio em marcha, mas o seu nome não é Islã
Carta Maior oferece aos seus leitores um caleidoscópio de reflexões sobre o contexto geopolítico e histórico dos atentados de Paris.
Joaquim Palhares – Diretor de Redação
“No mesmo dia do ataque ao Charlie Hebdo, 37 jovens foram mortos no Iémen num atentado a bomba.
No verão passado, a invasão israelita causou a morte de 2000 palestinos, dos quais cerca de 1500 civis e 500 crianças.
No México, desde 2000, foram assassinados 102 jornalistas por defenderem a liberdade de imprensa e, em Novembro de 2014, 43 jovens, em Ayotzinapa.
Certamente que a diferença na nossa reação diante desses acontecimentos não pode estar baseada na ideia de que a vida de europeus brancos, de cultura cristã, vale mais que a vida de não europeus ou de europeus de outras cores e de culturas associadas a outras religiões.
Será então porque estes últimos estão mais longe de nós ou conhecemo-los menos?
Será porque a grande mídia e os líderes políticos do Ocidente banalizaram o sofrimento causado a esses outros, quando não os demonizam ao ponto de nos fazerem pensar que eles não merecem outra coisa?
“Esta análise é urgente, sob pena de continuarmos a alimentar um fogo que amanhã pode atingir as escolas dos nossos filhos, as nossas casas e as nossas instituições”.
Com essas palavras carregadas de advertências ao consenso construído nos últimos dias, o sociólogo Boaventura Santos encerra um dos textos do ESPECIAL que Carta Maior oferece aos seus leitores, sobre o brutal atentado em Paris.
O material reúne artigos e reflexões de autores renomados, como o próprio Boaventura de Sousa e Santos, Julian Assange, Flávio Aguiar, Joe Sacco, Michael Lowy, Slavoj Zizek, Robert Fisk, Rita Almeida, Altamiro Borges, Tarik Ali, Leonardo Boff, José Antonio Gutierrez, Rosana Rossanda, Martín Granovsky, José Carlos de Assis, Cristiano Paixão, José Otávio Guimarães, Eduardo Febbro, Marcelo Justo , entre outros.
Esse mosaico de pontos de vista cumpre a função de um verdadeiro caleidoscópio da reflexão.
Trata-se de arguir as certezas graníticas rapidamente convocadas a partir da justa comoção gerada pelo massacre à redação do Charlie.
O objetivo aqui não é endossar a pauta do jornal, tampouco contestar a indignação justa, mas arguir a sua abrangência.
O que se busca é a reflexão capaz de romper a camada pétrea de conveniências e interesses sobre a qual se assenta o veredito conservador em torno da brutalidade desse episódio.
Ele anunciou o amanhecer de 2015 com um estrondo que sacudiu o novo normal disseminado por um capitalismo feito de deflação recessiva, desemprego estrutural e captura do Estado e da política pela internacional financeira.
Sim, é certo, como diz Boaventura, que um incêndio arde nas entranhas do nosso tempo.
Mas antes que ele se alastre de forma incontrolável sobre as nossas próprias consciências, é preciso afirmar peremptoriamente: seu nome não é Islã.
É para essa reflexão que Carta Maior convida à leitura deste ESPECIAL.
Fonte: Carta Maior
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