Por Lúcia Rodrigues
O Estatuto da Criança e do Adolescente chega aos 25 anos nesta segunda-feira, 13, sob fogo cerrado das bancadas da bala e evangélica no Congresso Nacional. Mas o ataque, desta vez, não para por aí. Além das forças conservadoras, até um tradicional defensor do ECA, como o governo petista, se levanta contra a legislação e advoga a necessidade de modificações no texto.
O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), se empenhou na costura da negociação que propôs a alteração do ECA, como moeda de troca para barrar a aprovação da redução da maioridade penal. Conseguiu na primeira votação, mas viu a estratégia derrotada, quando o presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), reapresentou o projeto no dia seguinte sob nova roupagem de uma emenda aglutinativa.
Guimarães chegou a dizer que se o PSDB da Câmara tivesse ouvido o do Senado, a redução da maioridade penal não teria sido aprovada em primeiro turno. Lá tramita o projeto do senador tucano José Serra (SP), que propõe alterações no Estatuto, como o aumento do tempo de internação, e que serve de modelo para os parlamentares petistas.
Inverte lógica
Para o juiz e presidente da Associação de Juízes para a Democracia (AJD), André Bezerra, a proposta de alteração do Estatuto da Criança e do Adolescente acaba sendo até mais perversa do que a PEC 171. “Porque aprova a redução da maioridade penal, sem mudar a Constituição.”
Ele explica que como o ECA é uma lei ordinária, não precisará contar com número de votos exigidos pela maioria qualificada prevista para a aprovação de uma PEC.
A proposta do governo que faz coro com o projeto de Serra é uma resposta à parcela da sociedade que defende o endurecimento da legislação contra os menores de idade. “Mas direitos humanos não se medem por índices de popularidade”, alfineta o magistrado.
André considera que qualquer alteração no ECA ou de redução da idade penal são inconstitucionais. “É cláusula pétrea. Não pode ser modificada”, frisa. “É gritante a inconstitucionalidade”, completa.
Saída
“É preciso reinserir o menino (na sociedade) e romper com a lógica punitiva. Se comenta que três anos é pouco... mas na vida de um jovem de 15 anos, é um quinto da sua vida... É desumano (aumentar os anos de reclusão)”, enfatiza.
Ele destaca ainda, que se um jovem comete algum ato infracional, a culpa não é dele, mas da omissão da família, do Estado e da sociedade. “Por isso, as medidas socioeducativas são adequadas. A lógica punitiva inverte a proposta do ECA. Vai se começar a punir jovens que ainda não têm formação moral completa.”
Aos críticos do ECA, André responde que o Estatuto ainda não foi colocado em prática.
“Faltou vontade política e econômica.”
O magistrado considera que a naturalização da miséria é o que deveria preocupar os parlamentares. “Isso é o que deveria estar sendo discutido no Congresso. Não dá pra achar que é natural meninos venderem chicletes no farol."
E adverte que caberá ao Supremo Tribunal Federal (STF) barrar a redução da maioridade penal, caso venha a ser aprovada no Parlamento. “O STF é o guardião da Constituição. Espero que tenha a coragem de impedir esse verdadeiro remendo à Constituição. Não é possível que se permita que jovens sejam jogados em calabouços medievais”, crítica, ao se referir às prisões brasileiras.
Leia a nota divulgada pela a Associação Juízes para a Democracia
Nota de repúdio à redução da maioridade penal e à ampliação do prazo de internação de adolescentes
A Associação Juízes para a Democracia, entidade formada por juízes de todo o Brasil, que tem dentre suas finalidades o respeito absoluto e incondicional aos valores jurídicos próprios do Estado Democrático de Direito, vem a público manifestar repúdio aos projetos de emenda constitucional e de lei que, ignorando cláusula pétrea da Constituição Federal, preveem a redução da maioridade penal e o aumento de tempo da medida socioeducativa de internação, cujos efeitos deletérios serão suportados primordialmente pela juventude pobre brasileira, utilizada como instrumento do mais rasteiro populismo penal voltado para mera promoção política.
Elogiado por ser um bem elaborado instrumento legal de garantias de direitos das crianças e adolescentes, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), embora formalmente em vigor há 25 anos, ainda não teve suas promessas transpostas da letra da lei para a realidade. O Estado tem falhado em não colocar em prática todas as medidas que garantam ao jovem brasileiro o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade, como preconizado pelo artigo 3°, do citado diploma legal. Em palavras mais claras, o jovem pobre brasileiro somente vai conhecer o Estado em sua face mais cruel, na forma de repressão.
No entanto, o mesmo Estado, negligenciando tais direitos fundamentais, opta, como é típico de regimes autoritários, tratar complexos problemas estruturais de uma sociedade desigual através da força do expansionismo penal. Veja-se, a propósito, que dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) mostram que 90 por cento dos jovens que praticam atos infracionais são negros, sem escola e de famílias que vivem com menos de um salário mínimo ao mês.
A redução da maioridade penal e o aumento de tempo da medida socioeducativa de internação revelam-se absolutamente inidôneas aos fins a que pretensamente se destinam – não há qualquer estudo científico sério demonstrando relação entre rigor na repressão penal e diminuição dos índices de criminalidade. Além disso, consistem em medidas potencialmente agravadoras do quadro de violência urbana que pretensamente buscam combater, diante dos já conhecidos efeitos estigmatizantes de um sistema prisional que somente contribui para marginalizar e excluir, em um círculo vicioso de violência que não cessará, quer seja a maioridade reduzida para 16, 14 ou 12 anos; quer seja o jovem internado até seus 26 anos.
A Associação Juízes para a Democracia posiciona-se, pois, de forma absolutamente contrária à aprovação dos projetos que preveem tais medidas, que significam, em última análise, reprovável e odiosa criminalização da juventude pobre brasileira.
Associação Juízes para a Democracia
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