O deputado terá de reconhecer que cumpriu com fervor o papel a que se propôs: defender os interesses dos granes grupos econômicos.
O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), convocou cadeia nacional de rádio e televisão para a próxima sexta (17), quando fará seu primeiro pronunciamento à nação. A justificativa apresentada é a necessidade de fazer um balanço deste primeiro semestre à frente do parlamento, mas o conteúdo do discurso e suas reais intenções ninguém sabe ao certo. "Às 20h25 minutos da sexta-feira, você fique em frente à televisão e você vai saber", disse aos jornalistas.
Se Cunha usar este espaço mais do que privilegiado, de fato, para fazer um balanço da sua gestão à frente da Câmara, terá que reconhecer que cumpriu com fervor o papel a que se propôs: defender os interesses dos granes grupos econômicos acima dos interesses dos brasileiros que o elegeram. Mas, por outro lado, também será obrigado a confessar que acumulou golpes, malfeitos, manobras e inimigos como poucos. Não por acaso, a palavra de ordem “Cunha golpista” ganhou as ruas e as redes.
De todos os escândalos protagonizados por Cunha, o de maior repercussão foi o que reduziu a maioridade penal no país de 18 para 16 anos. Favorável à pauta, o presidente da Câmara recolocou a matéria em votação até alcançar o resultado desejado, o que é ilegal. Mas o presidente da Câmara só segue as regras que lhe interessam. Inclusive, já havia aplicado o mesmo golpe antes, quando os deputados rechaçaram o financiamento privado de campanha, matéria que desagrada especialmente aos seus financiadores.
Evangélico, ele deixou aflorar seu cinismo ao propor ao parlamento matéria que institui o Dia do Orgulho Hétero e criminaliza o preconceito contra os heterossexuais. Também colocou sobre ameaça o Sistema Único de Saúde (SUS), ao propor matéria que obriga as empresas do país a contratarem os planos privados oferecidos por seus financiadores. Cunha mudou até mesmo os critérios para eleição da bancada feminina. E negociou com o Planalto a aprovação de uma parceria público-privada que lhe permitirá construir um shopping dentro do parlamento brasileiro.
Agora, ele busca acelerar os trâmites para a aprovação das matérias de seu interesse. Nesta terça (14), inclusive, venceu uma importante etapa para colocar seu plano em curso: aprovou na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) o projeto de resolução 191/09, de sua própria autoria, que altera o Regimento Interno da Casa, extingue a criação das comissões especiais e dá à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) competência para examinar o mérito de propostas de emenda à Constituição (PECs).
A preocupação é que, ao invés de balanço, Cunha use a cadeia nacional de rádio e TV para fazer política. Ou pior: politicagem. Seu papel assume ainda maior importância no atual cenário de crise porque é competência constitucional do presidente avaliar a procedência ou não de um possível pedido de impeachment contra a presidenta Dilma, que parte da oposição teima em fazer de tudo para viabilizar.
Nos jornalões, circula a informação de que, na semana passada, ele teria se reunido à portas fechadas com o mais tucano dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, para discutir o assunto. As suspeitas são de que a reforma política, cujas votações devem ser concluídas esta semana pela Câmara, também tenha entrado na pauta.
Gilmar Mendes é o ministro que engavetou a ação direta de inconstitucionalidade movida pela OAB contra o financiamento público de campanha, considerado o cerne da corrupção no país. E isso depois que a maioria dos ministros da corte já tinha votado contra o financiamento pelas empresas. Agora, na contrarreforma política que conseguiu emplacar na Câmara, a custas de manobras discutíveis, Cunha aprovou justamente um texto que constitucionaliza a prática e, portanto, regulariza o malfeito que Mendes protege.
Mas o conteúdo dessa conversa à portas fechadas, Cunha certamente não revelará à nação.
Fonte: Carta Maior
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