No caso do edital de concorrência para contratação dos ônibus, não houve qualquer debate na mídia e nem qualquer atenção por parte do Ministério Público.
Assistimos à uma enorme contradição na discussão da mobilidade e do uso dos espaços viários na cidade de S.Paulo.
De um lado, a abertura da Av. Paulista aos domingos para os pedestres, ciclistas e outros, em detrimento do uso preferencial por veículos motorizados ganhando enorme espaço na mídia, atenção redobrada e até intimidatória do Ministério Público. Medida acertada e que segue o que foi estabelecido na lei da Mobilidade de 2012. Pergunta-se, só nos domingos? Só na Paulista?
De outro, a publicação do edital de concorrência para contratação dos ônibus da cidade, algo que vai interferir na vida diária de milhões de pessoas e, ocorrendo o que está nele estabelecido, isso acontecerá pelos próximos vinte anos de prazo contratual, prorrogáveis por mais vinte!
No caso do edital, no entanto, quase nenhum espaço de discussão e debate na mesma mídia e nem sequer qualquer atenção por parte do Ministério Público.
O que pode significar essa diferença? Uma expressão do viés de parte da sociedade quanto ao uso concorrencial dos espaços viários pelo automóvel ou por outros meios de mobilidade não motorizados? Ou uma inconsciente, mas não tanto, desvalorização do transporte coletivo? Coisa de pobre...
Será que a Prefeitura se dá por satisfeita nesse silêncio seletivo da mídia ou até, quem sabe , faz uso acentuado do debate sobre a Paulista, para não ter que discutir mais amplamente o referido edital? Um método de prestidigitação? Enquanto se olha a mão esquerda, a mão direita faz a mágica?
Triste ver o desinteresse pela discussão desse assunto, no mesmo momento em que no dia 15 de setembro passado, o Congresso sancionou o transporte como direito social nos termos do artigo quinto da Constituição Federal.
Vamos a alguns aspectos fundamentais dessa licitação e ver porque se pensa ser um erro grave sua consumação tal como está.
Independentemente de aspectos positivos que o edital possa ter, destacaremos apenas os prazos contratuais de vinte mais vinte anos, e os equivocos da forma de remuneração dos serviços, questões centrais para a política de mobilidade e para o futuro da cidade. Esses dois condicionantes comprometem qualquer outro aspecto do edital.
Quanto aos possíveis vinte mais vinte anos de contrato, parece que se desconhece o que é uma metrópole como São Paulo, sua dinâmica de mudanças sejam tecnológicas, políticas, de usos e costumes e outras, bem como da cidade em si mesma, aí incluindo-se as que poderão advir das novas Leis de Uso do Solo e Zoneamento.
Como referência, esse novo edital estaria substituindo contratos realizados em 1995 ou 1975! Para se ter ideia do que pode se passar nesses períodos de tempo, somente em 1995 a internet entrava efetivamente na vida dos brasileiros e em 1975 nem sequer éramos uma democracia formal e o etanol e o biocombustível não eram usados como combustíveis para veículos.
Do ponto de visto econômico/financeiro, um contrato de operação de serviços de ônibus pode ter a duração, quando muito, do prazo de amortização do seu principal item econômico, o ônibus. Oito a dez anos são mais do que suficientes para tanto. Em Londres, contratos do mesmo tipo são feitos com a duração de cinco anos prorrogáveis por mais dois!
O que foi feito aqui? Foram incluídos no mesmo contrato, o Centro de Controle Operacional e os Terminais de Transbordo que são bens reversíveis e assim chegou-se ao prazo de vinte anos.
Porque incluir no mesmo edital esses dois tipos de contrato? Porque imiscuir as operadoras nessas duas atividades? Voltando a Londres. Lá essas duas atividades são da própria Autoridade de Transportes.
Não cabe o argumento de que a Prefetura estará assim fazendo economia de alguns milhões em investimentos. Pois faça a mesma economia contratando, em outro edital, empresas especializadas nesses serviços. Nada justifica imiscuir as “raposas na gestão do galinheiro”, para usar uma imagem. Muito menos, com isso, dilatar prazos contratuais.
Do ponto de vista do pagamento dos serviços o edital “prega uma peça”. De um lado reintroduz, finalmente, a remuneração dos serviços por custos operacionais e não por passageiro transportado como atualmente. Essa forma equivocada de remuneração por passageiro já foi objeto de crítica em texto publicado aqui na Carta Maior.
Mas de outro, soma uma estranha parcela de produtividade denominada PRO, na fórmula que estabelece o pagamento dos serviços e nessa PRO, reintroduz uma forma de remuneração por passageiro transportado!
Além disso, na citada fórmula chamada de IQ, Indice de Qualidade, algo que não mede qualidade mas, sim, só o cumprimento do contratado em forma de viagens realizadas, cumprimento de demanda e disponibilidade de frota.
Opinião dos usuários quanto à qualidade do serviço? Entra, porém não no IQ acima descrito, mas numa fórmula de rateio do tal PRO!
Em Londres, o London TravelWatch organização que representa o interesse dos usuários, faz com que a opinião dos usuários entre, sim, no pagamento dos serviços. E produtividade é produtividade mesmo e medida por menor consumo de combustível e manutenção, por conta de motoristas mais bem treinados e constantemente reciclados e não ônibus mais cheios.
E lá, pasmem, os contratos são por linha de ônibus ou conjunto de linhas, de tal modo que a cada ano se renovam de 15 a 20% dos contratos! Isso permite adaptação constante às mudanças tanto na cidade como no uso de novas tecnologias ambientalmente mais saudáveis.
Finalmente cabe uma palavra sobre o método da Prefeitura fazer as consultas sobre o edital e respondê-las.
Por exemplo, sobre uma proposta de mudança de prazo contratual para dez anos, a Secretaria dos Transportes respondeu que tal não seria possível porque esse prazo estava no Decreto Municipal 56232/15 que regulamentou a lei 13241/02 sobre os transportes na cidade. Ora, os atuais contratos que venceram em 2013, dez anos de duração portanto, tiveram edital regulamentado pelo decreto 42736/02, o qual regulamentou a mesma lei de 2001.
O que a Prefeitura esqueceu de dizer no caso, é que decreto se muda...mudando-o!
Fica ainda a questão; o Conselho Municipal de Transportes e Trânsito se deu por satisfeito com as respostas?
Não se sabe, pois publicadas, algumas como no exemplo acima, o edital foi publicado para a licitação no mesmo dia!
Seria cômico, não fosse trágico.
Fonte: Carta Maior
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