Sessão de tortura de um idoso inocente expõe brutalidade policial em Salvador. Agentes chegaram a introduzir um cabo de vassoura no ânus da vítima, como demonstraram os laudos médicos do caso. Em ato inusual de coragem, ele denunciou seus agressores na Corregedoria da Polícia Militar da Bahia
Idoso torturado em Salvador: Quatro agentes arrombaram a casa da vítima e a agrediram por mais de hora e meia
Maria Martín, El País
Era quase meia noite do dia 14 de junho quando a porta do senhor Elias*, de 62 anos, foi arrombada por quatro policiais do município de Dias D’Ávila, a 57 quilômetros do centro de Salvador, na Bahia. Ao susto inicial lhe seguiu uma sessão de mais de hora e meia de tortura na qual os agentes chegaram a introduzir um cabo de vassoura no ânus do idoso, como demonstraram os laudos médicos do caso. Os policiais, que haviam obtido esse endereço após, supostamente, torturar um usuário de drogas, acreditaram que seu Elias era o narcotraficante que buscavam. Mas os agentes não queriam prendê-lo, queriam grana. Eles o extorquiram e roubaram o pouco dinheiro que tinha, 200 reais em cédulas e outros 200 em moedinhas.
Elias, sem ficha policial, não se cansava de repetir que era trabalhador e que não tinha envolvimento com o crime, mas foi vendado e conduzido em uma viatura para outros locais onde foi submetido a novas agressões e ameaças, como a de atear fogo em seu corpo com gasolina. Tudo indicava que os policiais iam se desfazer de Elias, no que é chamado no jargão policial de “ponto de desova”, mas o idoso foi finalmente deixado em casa. Os policiais, um tenente e três soldados, perceberam que ele não era a pessoa que procuravam.
Seu Elias, em um ato inusual de coragem, denunciou seus agressores na Corregedoria da Polícia Militar da Bahia. O órgão fiscalizador da corporação abriu uma investigação e acabou pedindo a prisão dos acusados. O idoso foi examinado por médicos que certificaram feridas nos punhos, nos ombros, na mandíbula, nos joelhos, uma perfuração sangrante na região do ânus e fissuras no esfíncter. O relato detalhado nesta reportagem é parte do processo que levou o juiz militar Paulo Roberto Santos a decretar a prisão preventiva dos policiais sob a acusação de crimes de ameaças, roubo com violência e extorsão. “Os indícios suficientes de autoria emergem com clareza solar”, escreve o magistrado.
A análise do GPS da viatura constatou que o veículo encontrava-se na casa da vítima naquele dia e horário, e os investigadores não obtiveram uma justificativa oficial da visita a esse endereço. O relato das atrocidades sofridas por seu Elias foi tão contundente e detalhado que motivou a ordem de prisão na semana passada do tenente Isaias de Jesus Neves e os soldados Marcos Silva Barbosa, Alexandro Andrade das Neves e Carlos Eduardo de Sousa Torres, lotados na 36ª Companhia Independente da PM de Dias D’Ávila.
O magistrado afirmou que a prisão preventiva, considerada uma medida “extrema e excepcional”, é “de extrema necessidade” para a instrução criminal, para proteger a liberdade dos testemunhas e para garantir a ordem pública, pois a maneira como os policiais praticaram os delitos “demonstra sua periculosidade”. “Sem sombra de dúvidas a ordem pública encontra-se seriamente comprometida no caso em discussão, pois condutas tão infames, em tese, foram praticadas por policiais militares, justamente os agentes encarregados pela lei de preservar a ordem pública e garantir a paz social”, escreve o juiz na sua decisão onde acusa os policiais de assumir o papel de “algozes”. O magistrado negou o pedido de habeas corpus, que pretende evitar prisões arbitrárias, solicitado pela defesa dos acusados.
*O nome da vítima foi trocado para preservar a intimidade e integridade dela
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