segunda-feira, 16 de junho de 2014

O CAPITAL NO SÉCULO XXI”: SERÁ POSSÍVEL REFORMAR O CAPITALISMO?


A primeira vez que ouvi falar sobre a obra de Thomas Piketty “O Capital no Século XXI” não pensei que ela viria a marcar a minha compreensão e visão do mundo.

Provavelmente não serei a única. Tenho impressão que há milhares de “órfãos” do Marxismo, desiludidos com as aplicações práticas que dele fizeram até hoje, descrentes que possa haver um “Marxismo puro” que nada tenha a ver com tais aplicações e, ao mesmo tempo, dececionados com o que vemos na Europa nos últimos anos, com a austeridade, o desemprego e a crescente desigualdade.

A porta da social-democracia deixou de cativar, pelo menos em Portugal, onde os adeptos da redistribuição de riqueza preferem ultimamente manter o status quo da estrutura econômica e financeira, limitando-se a mudanças cosméticas. Os políticos que aqui chamamos de socialistas democráticos parecem não conseguir ou não querer resolver os problemas de fundo da economia de mercado. Ao mesmo tempo, os últimos anos provaram que passar para o “outro lado da barricada”, para o neoliberalismo, não é melhor remédio para a maioria da população. O regresso do capitalismo ao “laissez faire”, (liberalização, desregulação, financiarização e globalização da economia) mais acentuado após a queda do Muro de Berlim, gerou mais desigualdade e também mais injustiça.

Mas afinal do que fala Thomas Piketty?

Precisamente dessa desigualdade.

Após coletar dados sobre a evolução de 30 países, durante 300 anos, ele encontrou mecanismos que explicam a desigualdade econômica e o desenvolvimento de uma sociedade de herdeiros.

Assim, a história econômica dos últimos séculos mostra que o capitalismo é um sistema de produção que gera enormes desigualdades na repartição da riqueza – e isso fundamentalmente porque, nesse sistema, a “taxa de renda do capital” (r) tende a ser, em média e no longo prazo, maior do que a “taxa de crescimento da produção” (g).

“Caso se analise o período de 1700 até 2012, percebe-se que a produção anual cresceu em média 1,6%. Ao contrário, a renda do capital foi de 4 a 5%”, dizia Piketty numa recente entrevista.

Uma sociedade capitalista acaba sempre por ser uma “sociedade de herdeiros”.

Piketty entende o “capital” num sentido alargado, significando o mesmo que “patrimônio”, ou “riqueza”: diz respeito a todo e qualquer “ativo” (financeiro ou não financeiro, produtivo ou não produtivo).

Na sua conceção de capitalismo, Piketty vê-o, por um lado, como um enorme produtor de riqueza, de inovação, de tecnologia, de bem-estar, em suma: de desenvolvimento – mas, por outro, condena-o como um sistema que tende a repartir a riqueza de um modo demasiado desigual e, na verdade, injusto e antidemocrático.

A revista britânica The Economist apelidou-o recentemente de “Um Marx moderno”.

Ora, é muito importante sublinhar que, ao contrário do que afirmam vários críticos, Piketty não é marxista. O seu livro não propõe um sistema alternativo ao capitalismo, nem preconiza que venha a existir um tal sistema alternativo. Na verdade, Piketty defende que um determinado grau de desigualdade, bem como de competição em mercados regulados, é fundamental para que haja a inovação e desenvolvimento tecnológico.

Piketty disse numa entrevista ao jornal Expresso: “Sobre o meu marxismo é absurdo – sou da geração pós-Guerra Fria, pós-comunista. Tinha 18 anos em 1989, quando o Muro de Berlim caiu. Nunca tive nenhuma tentação pelo comunismo. A questão para mim sobre o mercado ou a propriedade privada nem se coloca. Estou vacinado contra a retórica anticapitalista. A questão é meter o mercado ao serviço do bem comum e da democracia e não a democracia ao serviço do mercado”.

O mecanismo que explica a desigualdade e que mostra ser intrínseca ao capitalismo é um mecanismo de acumulação de patrimônio.

Ora, se o capitalismo tende a gerar uma sociedade de herdeiros extremamente desigual, então o capitalismo não é uma meritocracia, (como muitos adeptos do empreendedorismo afirmam) mas tende a distribuir a riqueza e o rendimento de uma forma que é intrinsecamenteinjusta, toda a sociedade capitalista tende a ser uma plutocracia e a tornar-se materialmente incompatível com a democracia, mesmo que, formalmente, não se verifique tal incompatibilidade.

Sintetizemos o pensamento do autor:

"Primeiro: não há uma alternativa credível ao capitalismo;

Segundo: o capitalismo é, na verdade, um fator de desenvolvimento e criação de riqueza;

Terceiro: o atual sistema só proporciona taxas elevadas de crescimento econômico em períodos de recuperação e/ou de grande crescimento populacional e inovação tecnológica;

Quarto: no momento actual está plenamente instalada a dinâmica do r>g

Quinto e último: se nada de radical for feito nos próximos anos, é só uma questão de tempo até voltarmos a ter, nos países mais desenvolvidos, níveis de desigualdade tão injustos, antidemocráticos e autodestrutivos como os do século XIX." (João Constâncio, Público)

A solução proposta pelo autor francês – e a parte da sua obra que tem sido mais contestada – é um imposto progressivo mundial sobre a riqueza. Idealmente, este imposto seria mundial porque, de outra forma, a globalização permitiria a fuga de capitais para offshores ou para quaisquer outros países que não participassem nesse plano. Para além disso, propõe a colaboração internacional e a troca automática de informação bancária como formas de "desenvolver mais a transparência e obter fontes de informação mais confiáveis sobre a dinâmica da riqueza".
Não é de estranhar que os conservadores e liberais tenham ficado em pânico com as ideias de Thomas Piketty.

O Nobel Paul Krugman afirma num recente artigo: “O pânico em relação a Piketty mostra que a direita ficou sem ideias”.

Robert P. Murphy, economista e um dos defensores do mercado livre, escreve:

“Quero chamar a atenção para o estupefaciente ódio à propriedade privada e aos básicos direitos à privacidade financeira que permeia todo o livro. Piketty na realidade não tem nenhum interesse em apenas aumentar as receitas dos governos com seus esquemas tributários; o que ele realmente quer é acabar de uma vez por todas com a formação de fortunas. Para finalizar, um alerta a todos que ainda prezam valores ultrapassados como privacidade financeira e estado de direito: preocupem-se. Piketty e todos aqueles que estão tecendo louvores a seu livro não têm a mais mínima consideração pela maneira como uma pessoa construiu sua fortuna. Não importa se você trabalhou duro, poupou e foi um corajoso empreendedor. Tudo será confiscado”.

Será possível pôr as ideias de Piketty em prática?

Na minha opinião, muito dificilmente. O próprio Piketty não é particularmente otimista. Dado o poder de lobby dos grandes capitais e, em muitos casos, a sua direta manipulação da política dos Estados, como tem acontecido na presidência de Barack Obama, por exemplo, é bastante improvável que se possa ir adiante. Na verdade, o poder daqueles que concentram a maior riqueza não deixará facilmente que esse poder lhes seja retirado.

Fonte: Voz da Rússia

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