segunda-feira, 20 de julho de 2015

BRASIL: ENERA TEM O DESAFIO DE CRIAR UM NOVO ESPAÇO DE ARTICULAÇÃO ENTRE OS TRABALHADORES DA EDUCAÇÃO


Em entrevista, Divina Lopes, do MST, fala sobre as perspectivas e desafios do 2° Encontro Nacional de Educadores da Reforma Agrária.

Por Maura Silva
Da Página do MST

Entre os dias 21 e 25 de setembro, Brasília sediará o 2° Encontro Nacional de Educadoras e Educadores da Reforma Agrária (Enera).

O encontro, que reunirá educadores do campo de todo país, tem como objetivo debater o atual momento da educação pública brasileira, cada vez submetida a uma lógica mercantilizada ditada por grandes grupos financeiros.

Em entrevista à Página do MST, Divina Lopes, do setor de educação do Movimento, fala sobre as perspectivas do encontro e seus principais desafios, que pretende reunir cerca de 1.200 participantes durante os cinco dias de encontro.

Para ela, vivemos num período de crise em que o capital precisa pensar novas formas de se reproduzir, e uma dessas frentes é o avanço cada vez maior sobre a educação.

Diante deste cenário, Divina Lopes ressalta que o 2° Enera terá o papel de propor a construção de um novo espaço de articulação entre os trabalhadores da educação a sociedade, para disputar a educação pública e criar “um novo projeto de educação que garanta a formação dos sujeitos nas diferentes dimensões humanas, numa perspectiva libertadora e transformadora”.

Quais os principais desafios do 2° Enera?

Um dos principais desafios do ENERA é denunciar a atual situação da educação pública em nosso país. Vivemos um período de crise, em que o capital necessita pensar novas demandas que possibilite a sua reprodução. Com isso, percebemos cada vez mais o avanço do capital também na educação.

Temos percebido que cada vez mais se consolida o modelo empresarial na educação. As grandes corporações do agronegócio, das indústrias e dos meios de comunicação têm adentrado no sistema educacional brasileiro, desde a educação básica ao ensino superior, com a conivência e parceria do Estado.

Essas formas de exploração, precarização, apropriação e controle empresarial da educação pública pelas corporações empresariais, além de serem violentas e inaceitáveis, precisam ser denunciadas.

Dentro disso, o Enera cumprirá o papel de denúncia, além de se propor ao desafio de constituir num espaço de articulação entre os trabalhadores da educação à sociedade, disputando a educação pública e um novo projeto de educação, que garanta a formação dos sujeitos nas diferentes dimensões humanas, numa perspectiva libertadora e transformadora.


Passado 18 anos do primeiro Enera, o que esperar deste segundo encontro?


O 1° Enera se constituiu num espaço de apresentação pública das experiências formativas e educativas do MST, e também um espaço de reivindicação e luta pelo acesso ao direito de estudar no campo em condições dignas e com uma proposta educacional que considerasse a especificidade, diversidade e a perspectiva de projeto defendido por estes sujeitos.

No 2° Enera os desafios continuam, mas num contexto ainda mais complexo, de avanço e hegemonia do agronegócio, disputando os territórios materiais e imateriais com os sujeitos que vivem e reproduzem a vida no campo.

O segundo encontro está colocado neste contexto de avanço da disputa do capital também pela educação pública do nosso país. Trata-se também de um momento de acirramento da luta de classes, em que o grande desafio é construir unidade em torno de uma educação pública e popular, e de um projeto de país que supere o atual estágio de desigualdade.

Nos últimos anos tem aumentado o número de greves e mobilizações nos trabalhadores da educação. A que se deve esse crescimento

Temos percebido que o avanço das reformas neoliberais está retirando direitos conquistados por meio de muita luta dos trabalhadores, e que isso tem aumentado significativamente o número de greves nos últimos anos.

Em relação aos trabalhadores da educação, vemos que o aumento das reivindicações vem acontecendo tanto entre os servidores das instituições públicas de ensino superior, como entre os trabalhadores da educação básica.

Percebemos também que há uma maior articulação com a sociedade, uma qualificação da pauta de reivindicação, que vai além do salário, discutindo as condições de trabalho e a situação do avanço da privatização e precarização da educação em geral.



E é possível combinar a luta pela educação do campo com a da cidade?


Acreditamos que as escolas/universidades públicas são espaços estratégicos de formação da classe trabalhadora. São espaços que devem ser disputados na perspectiva da luta de classes. Temos essas realidades de precariedade nas escolas também nas periferias da cidade, pois é uma realidade da escola pública. Por isso, a luta pela educação pública deve ser uma luta do campo e cidade de forma conjunta.

O ENERA, além de ser o espaço em que vamos poder denunciar esse atual modelo de educação que não interessa aos filhos e filhas da classe trabalhadora, será o momento de fazermos a defesa e repautarmos um projeto de educação que vise o sujeito dentro de todas as suas perspectivas e dimensões. Um projeto que considere e potencialize a diversidade cultural que existe no nosso país.

Além disso, será um importante espaço de articulação dos educadores Sem Terra com os demais trabalhadores que atuam na educação e, que neste momento, estão em luta na defesa da educação pública. Acreditamos que o ENERA vai preencher essa lacuna na articulação e nos debates sobre os rumos que a educação pública está tomando no nosso país.

Na última década foram fechadas mais de 36 mil escolas no campo. Apenas em 2014, outras 4 mil fecharam suas portas. A que se deve essa realidade?

O fechamento das mais de quatro mil escolas no campo, somente no ano de 2014, tem a ver com a ofensiva do capital contra a educação. Temos percebido que o Estado brasileiro fez uma opção pelo modelo empresarial de educação. A lógica que opera hoje na educação é a lógica do custo benefício e da produtividade.

A escola tem que alcançar metas como uma empresa, não se discute o tipo de formação que é oferecida para os diferentes tipos de sujeitos que compõem seu núcleo. 

As formas de acesso aos estudantes é falha, não se sabe de que maneira os alunos estão acessando a educação nas escolas e em que condições. Além de não se considerar a diversidade existente em nosso país, principalmente das populações que vivem e reproduzem a vida no campo.



Diante disso, quais os principais desafios da educação do campo?


Os desafios da educação do campo no atual contexto permanecem ainda na dimensão da garantia ao acesso e permanência na escola, e das condições da estrutura física e pedagógica necessária e adequadas ao processo de aprendizagem.

No entanto, também temos novos desafios, como a denúncia dos atuais programas educacionais voltados para o campo, que visam apenas uma formação precarizada e mercantil, bem distante dos princípios da Educação do Campo, que defendem a formação dos sujeitos na sua totalidade.

O Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA), conquistado após o massacre de Eldorado do Carajás, no Pará, em 1996, e o 1° Enera, em 1997, pela sua vasta experiência na formação dos sujeitos do campo, desde a alfabetização ao Ensino Superior, deveria servir de base para construção de uma política pública de educação do campo. Ao contrário disso, vem sendo asfixiado e esvaziado pelo Estado.


Fonte: MST Org

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