Na eleição, os políticos que mandam bater nos moradores que ocuparam o terreno da Oi circulam entre sorrisos e beijam crianças.
“Meu filho levou um tiro em cima da vista. Está em ponto de perder a visão por causa dessa truculência. Cadê o governador e o prefeito pra chegar e conversar direito, fazer uma negociação?”.
A pergunta é de uma das moradoras retiradas da ocupação do terreno da Oi, no Engenho Novo, Rio de Janeiro. E reflete o fato de que o Estado só se aproxima das regiões de conflito por meio da polícia.
Na operação, o soldados do Bope, o Batalhão de Operações Especiais da PM, usaram uma retroescavadeira para limar o terreno ocupado há 11 dias por cerca de 5 mil pessoas. Os militares colocaram fogo nos compensados usados na construção dos barracos. Um ônibus foi incendiado por manifestantes e o fogo se espalhou por uma casa.
Em casos como este, não existe outra preocupação se não o controle, praticado através de um ciclo de medo e violência. Na entrevista transcrita acima, a moradora chega a afirmar: “foi aqui que eles [governador e prefeito] pegaram mais voto”.
A frase ecoa por alguns segundos ao fim do vídeo: “foi aqui que eles pegaram mais votos”.
O ciclo de medo e violência se perpetua através da esperança.
Nas eleições, os mesmos atores políticos que aparecem na forma de cassetete da PM durante o mandato circulam entre os moradores, beijam crianças, comem pastel de feira e, é claro, alimentam a esperança de que aquelas pessoas podem ter alguma dignidade no futuro. No futuro.
A esperança é capaz de anular qualquer poder de ação política, já que retira o sujeito do presente. O presente, a miséria da rotina, vai sendo naturalizada em nome de um futuro digno.
Mas e se um sujeito resolve interromper o aparente fluxo natural das coisas?
E se um sujeito não achar tão natural assim a desigualdade de oportunidades e condições?
E se um sujeito resolve ocupar um terreno abandonado há anos para construir uma casa ou unicamente para reafirmar a sua existência e a existência de um problema que, de tão naturalizado, parece nem ser mais um problema: algumas pessoas não têm onde morar?
A resposta está no ciclo da violência: qualquer interrupção no fluxo aparentemente natural das coisas precisa ser neutralizada por uma violência constante, que às vezes é chamada de pacificação.
A pacificação nada mais é do que a autorização do uso permanente da violência para – veja só! – garantir a paz. Mas a pergunta é: a paz de quem? Dos moradores da Zona Sul? Dos turistas? Para quem o governador e o prefeito estão trabalhando?
Em ano de eleição, é bom repetir a frase da moradora: “foi aqui que eles pegaram mais voto”.
Fonte: Carta Capital
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