No Irã ocorreu uma série de atentados contra mulheres que usavam um “hijab incorreto”. As vítimas foram regadas com ácido por usarem roupa que, na opinião dos fundamentalistas, era inadequada. Uma mulher morreu e outras perderam a visão.
Que razão motivou esses atos desumanos? Eles terão algum significado político? Esta é a opinião da conhecida orientalista russa Elena Dunaeva, especializada em assuntos do Irã:
“O problema do hijab dificilmente ocupa hoje um lugar central no Islã, numa altura em que islamitas radicais cortam cabeças aos infiéis usando slogans islâmicos. Nós assistimos a isso nos territórios do Iraque e da Síria ocupados pela organização Estado Islâmico.
“Contudo, a relação com o nível de liberdade permitido no uso desse mesmo hijab demonstra o grau de tolerância da sociedade.”
A Revolução Islâmica introduziu a severidade no Irã, inclusivamente no uso do vestuário.
No final dos anos 90, teve início um processo de transformação da ideia do hijab. As mulheres elegantes iranianas são criativas no uso do corte e das cores, se afastando cada vez mais dos tons escuros e pouco luminosos. No Irã surgiu uma moda islâmica original e muito atraente, mesmo para os padrões europeus. Além disso, geralmente essa roupa, o “novo hijab”, cumpria as normas da legislação em vigor.
Mas isso nem sempre acontecia. As fashionistas iranianas por vezes tapavam a cabeça de uma forma que deixava ver o cabelo por baixo do lenço. Pior ainda: começaram usando a cosmética de uma forma mais ativa e ousada. Tudo isso é proibido pelas leis da sharia.
Essa evolução do hijab provoca ataques de raiva nos círculos conservadores. Além disso, essa sua reação se intensifica nos períodos de uma relativa liberalização da vida social depois de muitos anos de pressões ideológicas, quando pensar em manicura ou em rusari (lenços) coloridos era simplesmente perigoso.
Nesse contexto recordamos determinados paralelismos históricos. Durante a segunda metade dos anos 50, na URSS, depois da morte do ditador Stalin, surgiram grupos de jovens que desafiavam a uniformidade e cinzentismo no vestuário impostos pelo regime estalinista ao longo de muitos anos. Eles passaram a ser chamados de stilyagi, os “estilosos”. Eles eram vigorosamente combatidos pelos órgãos ideológicos que eram defensores da herança estalinista. Os stilyagi eram detidos, espancados, sua roupa colorida era rasgada e suas cabeças eram rapadas de maneira a que não usassem penteados provocantes.
Na República Islâmica do Irã a reação dos conservadores contra as mulheres mais seguidoras da moda aumentou tanto durante a presidência do liberal Mohammad Khatami, como com o atual presidente Hassan Rohani. Talvez no fundo isso não seja uma reação contra as próprias mulheres, mas contra a política desses presidentes em geral, a qual não agrada aos radicais. Os ataques com ácido contra mulheres são uma manifestação dessa reação.
No Irã, ao contrário da URSS dos anos 50, as autoridades oficiais condenaram esses crimes. O presidente Hassan Rohani, quando venceu as eleições há já mais de um ano, se pronunciou de forma favorável à escolha feita pelas mulheres da roupa que deveriam usar. Ele sublinhou que era contra as atitudes negativas contra as mulheres que não usam o hijab, acrescentando que uma mulher sem o hijab nem sempre demonstra ausência de modéstia. Neste momento, e a propósito dos últimos acontecimentos, o presidente Rohani declarou: “Nós não nos devemos concentrar demasiado em problemas como o hijab incorreto.”
Mesmo partidários do cumprimento rigoroso da sharia como o oficial do Corpo de Guarda Revolucionária Islâmica Akbar Pakzad e o líder religioso Mohammad Taghi Rahbar condenaram vigorosamente os ataques contra suas compatriotas.
Milhares de iranianos saíram em massa às ruas de Teerã, Mashhad, Isfahan, Saqqez, Resht, e outras cidades do país, em manifestações de protesto pelo fim da violência contra as mulheres muçulmanas.
O problema do hijab adquire um caráter político. Os fundamentalistas vêm o “hijab incorreto” como parte da grande ameaça contra a República Islâmica por parte do Ocidente. Um dos clérigos ultraconservadores iranianos, Ali Reza Panahian, declarou: “O hijab já não é apenas um valor moral. Ele é uma questão estratégica, política e… uma questão de segurança.”
Não é por acaso que o Majlis (parlamento) conservador aprovou recentemente uma lei que reforça os poderes da chamada “polícia da moralidade”.
Surge uma questão: porque é precisamente agora que aumenta a tensão relacionada com o hijab? A resposta é só uma, se trata de uma tentativa das camadas mais conservadoras da sociedade de desacreditar o avanço das tendências liberais nas políticas externa e interna do governo de Hassan Rohani. Se trata de pressões para travar os processos de evolução. O “hijab incorreto” é apenas um pretexto para mais um ataque dos radicais.
No dia 7 de novembro, no festival de moda a realizar em Dushanbe (Tajiquistão), os estilistas iranianos irão apresentar seus trabalhos. Provavelmente eles não irão apenas apresentar a burca e o chador. A vida continua.
Fonte: Voz da Rússia
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