Vítima de paralisia infantil e morando há mais de 40 anos em uma
UTI do Hospital das Clínicas, em São Paulo, Paulo Henrique Machado, 45, decidiu
transformar suas aventuras em uma animação 3D.
Voltada para o público infantil,
a série de desenhos "As Aventuras de Léca e Seus Amigos" mostra a
infância de sete crianças com deficiência física. Léca, melhor amiga de Paulo,
mora na cama ao lado.
É Eliana Zagui, também vítima da
pólio e autora do livro "Pulmão
de Aço - uma vida no maior hospital do Brasil" (Belaletra Editora, R$ 36).
Para sair do papel, o projeto
tenta um financiamento coletivo por meio do site http://catarse.me/pt/leca
Até sexta-feira, tinha conseguido
só R$ 8.800 dos R$ 120 mil necessários para a produção.
Minha mãe morreu dois dias depois que eu nasci. Com um ano e meio, tive
paralisia infantil. Vim para o Hospital das Clínicas sem movimento nas pernas
e, com o tempo, a paralisia atingiu também meu sistema respiratório.
Desde então, dependo do aparelho de respiração artificial para continuar
vivo.
Aqui no hospital, aprendi a ler e a escrever. Conclui o ensino médio e
fiz vários outros cursos de informática e na área de softwares.
Lembro-me de quando era pivete, podia andar de cadeira de rodas pelo
hospital e visitar meus amigos em outros quartos. Líamos historinhas infantis
uns para os outros.
Minha capacidade de respiração foi piorando e eu já não podia mais sair
da cama. Eu e mais seis amigos, todos com paralisia infantil, fomos
transferidos para um quarto [só ele e Eliana Zagui sobreviveram]. Era uma
gangue.
Eu e a Tânia éramos os líderes e discutíamos muito. O principal motivo
era a televisão. Havia dois aparelhos e a gente ficava competindo pelo volume,
pelos programas. Os meninos queriam futebol, as meninas, novela.
PIPAS PELA JANELA
Apesar de estarmos presos às camas, a gente inventava brincadeiras que estimulavam a imaginação.
Apesar de estarmos presos às camas, a gente inventava brincadeiras que estimulavam a imaginação.
Eu, o Pedro e o Anderson tínhamos movimentação nos braços [as meninas
não tinham] e fazíamos pipas para brincar e para vender. O Anderson conseguia
soltar da janela do quarto.
Era engraçado porque não ventava o suficiente. Quando a pipa estava
quase subindo, caía. Era muita pipa perdida. Enganchavam nas árvores, ou eram
pegas pelos meninos que já ficavam perto do hospital à espera delas. Sempre
machucava a mão afiando o bambu com canivete.
Aqui no hospital tive muita oportunidade de fazer coisas que qualquer
outra criança podia fazer lá fora, como armar arapucas para pegar passarinho no
fundo do terraço. A diferença é aqui a gente só pegava pomba.
Um dia encontrei um gafanhoto e o amarrei com barbante. Fazia de conta
que eu era o Pinóquio e ele o grilo falante. Também ganhava
"presentes" dos funcionários.
Uma atendente me deu uns tatus-bolas. Outro médico que trabalhava aqui,
o doutor Giovani, que eu chamava de pai [Paulo tem pai, mas que raramente o
visita], me trouxe duas pererecas, aquelas que dão em rio.
Eu tentava pegar, e elas pulavam. Foi aquela histeria generalizada na
UTI.
Em 1992, pensei o que poderia ter para produzir, criar alguma coisa. Foi
quando escrevi uma carta para uma empresa pedindo a doação de um computador.
Comecei a estudar informática sozinho. Era um modelo MSX, bem limitado. Em
1994, ganhei meu primeiro PC.
No início, era aterrorizador, eu vivia quebrando o computador. A coisa
melhorou depois que os hospital deixou os técnicos de informática à disposição
para me ajudar. Hoje eu monto computadores. Tenho meu segundo PC montado.
A partir de 2004, lutei, também sozinho, para me profissionalizar na
área de 3D. Em 2011, achei que eu precisava de um curso para trabalhar com
computação gráfica. Fui atrás do Senac, e o professor veio até o hospital.
Desde então, comecei a alimentar a esperança de um dia me envolver
profissionalmente com a sétima arte. Adoro cinema, meu ídolo é Charles Chaplin
(1889-1977).
histórias
histórias
Foi aí que pensei numa animação com deficientes físicos. Mas não sabia
se isso despertaria o interesse das pessoas. Foi então vendo as animações com
personagens deficientes feitas por um estúdio britânico de que eu gosto Aardman
Animations, especializado em animações stop-motion], que fez a "Fuga das
Galinhas", que pensei estar no caminho certo.
Pensei que as minhas aventuras e dos meus amigos aqui dentro do hospital
já dariam um bom roteiro para uma série animada.
Ao colocar as histórias das nossas vidas, minha ideia é que as crianças
possam assistir e aprender que o deficiente, numa cadeira de rodas, não é tão
diferente assim. As histórias também contam sobre passeios que fiz ao
Playcenter, ao circo, por exemplo.
Já roteirizei cinco histórias. Meu objetivo é finalizar a primeira
temporada com 13 roteiros. Cada episódio tem 12 minutos. Se o vento continuar
soprando, outras temporadas virão. E se as pessoas gostarem, nada impede que um
dia vire um longa metragem.
A ideia com o Catarse é que as pessoas compartilhem ideias sobre o
projeto e deem uma força. Uma árvore para crescer precisa ser regada. A árvore
em questão não é de uma só pessoa. A ideia foi minha, mas o projeto da animação
pertence a todos.
Segue o link
do Canal no YouTube e o Blog
http://www.youtube.com/naoquestione
http://nao-questione.blogspot.com.br/?view=flipcard
Gostaria de adicionar uma sugestão, colabore com o NÃO QUESTIONE
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