quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

JUIZ EXIGE A SUSPENSÃO DO WHATSAPP NO BRASIL


O juiz, do Tribunal de Justiça do Piauí, não informou o motivo do pedido de suspensão pois ação anterior corre em segredo

TERESINA/SÃO PAULO – O juiz da Central de Inquéritos de Teresina, Luiz Moura Correia, determinou que o acesso ao aplicativo WhatsApp seja suspenso por descumprimento de ordem judicial para interceptação telefônica para elucidação de crimes.

“A ordem judicial foi expedida em virtude de anterior descumprimento, por parte do provedor de aplicação de Internet WhatsApp, de outras determinações de caráter”, diz a nota divulgada pela Polícia Civil do Piauí.

Na decisão, o juiz deu 24 horas para que a empresa suspenda não só os acessos a serviços dos domínios whatsapp.net e whatsapp.com, mas como o uso do aplicativo. A sede da empresa, nos Estados Unidos, foi notificada para dar cumprimento à determinação judicial.

O magistrado informou que a decisão é resultado de inquéritos que tramitam em segredo de justiça desde o ano de 2013. Ele disse que a quebra do sigilo do contato por WhatsApp serviria para a elucidação dos crimes.

“O WhatsApp não quis se adequar ao caso da interceptação e foi notificado quanto a isso. Determinamos a suspensão do serviço para cumprir as diligências. Trata-se de uma questão de soberania nacional. Para operar aqui, a empresa tem que se adequar as leis daqui”, explicou Luiz Moura.

Segundo o juiz, depois do Marco Civil da Internet, a empresa que funciona nos Estados Unidos, tem que dar cumprimento às decisões locais. “É para o Brasil discutir a questão. São vários casos em questão. Como se trata de segredo de Justiça, não posso falar sobre o assunto. Quem pode falar são as autoridades policiais”, acrescentou.

Os servidores do Tribunal de Justiça do Piauí estão em greve solicitando reajuste salarial de 10% e a reestruturação do quadro de servidores, mas o juiz Luiz Moura foi procurado ontem (25) por advogados de empresas para dar cumprimento a ordem judicial e outros tentando evitar a execução da decisão.

A polícia informou apenas que são vários processos que correm em segredo de justiça. Os casos são investigados pelo Núcleo de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública do Piauí.

Parte da decisão judicial diz: “Suspenda temporariamente até o cumprimento da ordem judicial, em todo território nacional, em caráter de urgência no prazo de 24 horas após o recebimento, o acesso através dos serviços da empresa aos domínios whatsapp.net e whatsapp.com, bem como todos os seus subdomínios e todos os outros domínios que contenham whatsapp.net ewhatsapp.com em seus nomes e ainda todos números de IP (Internet Protocol) vinculados aos domínios já acima citados”.

“Eu acho muito difícil que essa decisão chegue a ser cumprida”, opina a advogada Gisele Arantes. “Bloqueando o WhatsApp você está afetando o direito de outras milhares de pessoas. É muito desproporcional.”

Ainda que seja um crime como pedofilia, não justifica a remoção do serviço.
Segundo o jornal O Globo, a Vivo foi comunicada da decisão no último dia 19, e já entrou com recurso para não ter de cumpri-la.

Procurados pela reportagem, as operadoras afirmaram que se pronunciarão oficialmente através do SindiTelebrasil, que, em nota disse ter recebido “com surpresa” a decisão, e que a medida poderia “causar um enorme prejuízo a milhões de brasileiros que usam os serviços, essenciais em muitos casos para o dia a dia das pessoas, inclusive no trabalho”.

Para o SindiTelebrasil, “a medida é desproporcional” e lamentou o fato de assumir as operadoras como alvo a fim de atingir a empresa responsável pelo WhatsApp, as “não têm nenhuma relação com o serviço”, segundo o comunicado.

Sem representação

O WhatsApp, assim como Snapchat, Tinder e Secret, não possuem representação no Brasil, o que dificulta o acesso por meio jurídico dos seus usuários ou reclamantes. No caso específico do WhatsApp, uma saída dos tribunais tem sido a de destinar a ação ao Facebook, que concluiu a aquisição da empresa criadora do aplicativo (por US$ 22 bilhões) em meados do ano passado.

Em agosto do ano passado, uma liminar determinou a suspensão do aplicativo Secret no Brasil acatando pedido de promotor que acreditava que o app feria a proibição ao anonimato, presente na Constituição. A Justiça posteriormente voltou atrás e liberou o aplicativo, após entender que era possível obter os dados dos usuários através da empresa responsável.

Para o jurista e diretor do instituto de pesquisas InternetLab, Dennys Antonialli, o caso do Secret é simbólico. “Ele ilustra o poder máximo do Artigo 11 (do Marco Civil da Internet), que é banir o serviço do Brasil. Aplicar uma multa ou constranger a empresa não adiantaria nada, porque ela não tem escritório aqui”, diz o pesquisador.

Antonialli defende que o juiz poderia ter buscado formas menos drásticas para atingir a empresa após não ter tido resposta. “O WhatsApp tem uma base de usuários gigantesca no Brasil e é uma das formas de comunicação mais utilizadas. Por conta de um inquérito, o serviço poderia cair no Brasil inteiro”, disse. “Há meios mais sutis para constranger a empresa, impondo multa alta diária, por exemplo.”

O artigo em questão diz que empresas que coletem, armazenem ou guardem e tratem registros de dados pessoais “em que pelo menos um desses atos ocorra em território nacional, deverão ser obrigatoriamente respeitados a legislação brasileira e os direitos à privacidade, à proteção dos dados pessoais e ao sigilo”. A regra vale “mesmo que as atividades sejam realizadas por pessoa jurídica sediada no exterior, desde que oferte serviço ao público brasileiro”.

Na opinião da advogada Gisele Arantes, especialista em direito digital que atuou no caso do aplicativo Secret, o Marco Civil “falhou” ao não prever “uma forma de se alcançar esse provedor de aplicações lá fora quando se precisar de alguma informação”. E resume a atual situação. “Se você é ofendido pelo WhatsApp, você vai ter que identificar as pessoas e responsabilizá-las; para conseguir essas informações, você precisa mandar uma ordem para o WhatsApp, mas ele está lá fora e para isso seria necessário uma carta rogatória, o que demoraria anos.” A jurista espera que o caso “chame a atenção das autoridades para esse buraco”.

O caso se assemelha a um de 2007. Na ocasião, um juiz chegou a suspender por um dia o YouTube no Brasil após tentativas fracassadas de impedir que um vídeo da apresentadora e modelo Daniella Cicarelli, que foi gravada durante ato sexual com o namorado em uma praia na Espanha. A decisão foi então derrubada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo.

Fonte: Estadão

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