Diante do constatado crime ambiental provocado pelo rompimento das duas barragens na mineradora Samarco, em Mariana (Minas Gerais), que espalhou lama tóxica por toda a cidade, matando pessoas e contaminando rios, a Vale afirmou não ter responsabilidade direita ou indireta sobre o assunto, pois é apenas acionista da empresa.
Os defensores do mercado gostam de dizer que é preciso reduzir o papel do Estado para promover a livre concorrência e assim, segundo a tese da elite neoliberal, garantir consequentemente a melhoria das condições do povo.
A Samarco nos últimos 12 meses, encerrados em setembro, representou 14,95 milhões de toneladas de minério de ferro na produção da Vale, totalizando 340 milhões de toneladas no mesmo período. Apesar de desfrutar de todos os lucros gerados pela Samarco, a empresa afirma: “A Vale é apenas mera acionista da Samarco, sem qualquer interferência operacional na gestão da empresa, direta ou indiretamente, de perto ou à distância”, disse um porta-voz em resposta por e-mail a perguntas do The Wall Street Journal.
A Samarco é uma joint venture pertencente à Vale e à anglo-australiana BHP Billiton, cada uma com 50% de participação. A postura evidencia como o mercado se posiciona diante de uma situação que ainda não é possível mensurar as consequências ambientais, sociais e econômicas, sem mencionar as vidas que forma ceifadas por tal negligência. A empresa vira as costas e reafirma que “não tem qualquer responsabilidade pelo infeliz e triste acidente que ocorreu em Mariana, Minas Gerais”.
A Vale disse ainda que a Samarco é uma empresa de “responsabilidade limitada”, que atua independentemente de seus acionistas e é responsável por todas as questões técnicas e financeiras relativas às suas operações. A outra acionista BHP Billiton também seguiu o mesmo discurso, e disse não ter responsabilidade nenhuma sobre as operações.
Como a preocupação é não perder os lucros, a Vale está a busca de aumento de produção em outras minas. Pedro Galdi, analista de investimentos da Whatscall Consultoria, disse em entrevista ao Estado de Minas: "A Vale pode suprir a falta da Samarco aumentando o ritmo de extração em outras reservas, mas a BHP tem maior dependência da produção de Mariana”.
Cidade mergulhada na lama tóxica
Enquanto as empresas fogem, a lama tóxica continua a devastar a cidade Mariana (MG) descendo Rio Doce em direção ao Espírito Santo. Os procuradores da República que atuam no caso já informaram que mineradora terá que arcar com os danos ambientais causados pelo erro e negligência.
João Munhós de Souza, procurador da República em Colatina, no Espírito Santo, afirmou que, para casos de danos ambientais, a jurisprudência tem sido clara no sentido de que não é necessária demonstração de culpa da empresa pelo evento que gerou o dano para que ela seja obrigada a arcar com os custos de reparação.
“Basta a demonstração de que houve o dano e que houve uma relação entre dano causado e a atividade empresarial desenvolvida pela empresa, que ela se torna responsável pelo dano causado”, disse o procurador.
O MPF conseguiu junto à Justiça uma liminar que obriga a Samarco a fornecer às autoridades locais um helicóptero para sobrevoar o Rio Doce com o objetivo de produzir provas que futuramente serão usadas em ações de reparação de dano ambiental.
A liminar também determina que órgãos ambientais realizem testes para analisar a água do Rio Doce, que é captado para consumo em cidades capixabas, antes, durante e depois da chegada da onda de lama.
“Isso é relevante para que seja realizado um registro mais fiel possível da situação antes e depois para serem identificados os danos e até quantificados eventuais danos ambientais”, disse Munhós.
Os procuradores também exigem que a empresa forneça carros-pipa para garantir o abastecimento de água nas cidades do estado banhadas pelo Rio Doce. Até agora, a empresa ofereceu 40 carros-pipa, mas as autoridades querem que a mineradora arque com um número maior desse tipo de veículo para atender à população.
A preocupação é com a contaminação dos leitos dos rios, que poderá provocar a interrupção do abastecimento de água na região.
Segundo as prefeituras das cidades capixabas de Baixo Guandú, Colatina e Linhares já é possível notar uma pequena alteração na água do Rio Doce, que banha esses três municípios, mas a parte mais densa da lama ainda não chegou à região e, por isso, o abastecimento de água ainda não foi interrompido.
De acordo com o Serviço Geológico Brasileiro, que iniciou o monitoramento diário da Bacia do Rio Doce após o rompimento das barragens, houve uma separação entre uma “onda de cheia”, composta principalmente por água, e uma segunda onda, essa com mais elementos sólidos e lama na sua composição.
Essa segunda onda ainda não chegou às cidades capixabas. Segundo as previsões, ela deve chegar em Baixo Guandú entre quinta e sexta-feira. É provável que com a chegada dessa segunda onda, o abastecimento de água tenha de ser interrompido, disseram autoridades locais.
As cidades capixabas banhadas pelo Rio Doce já vêm sofrendo há meses com uma crise hídrica por causa da seca no rio e algumas cidades implementaram o racionamento de água. Por outro lado, o baixo volume do rio afasta o risco de inundação com a chegada da onda de lama das barragens da Samarco.
Em Baixo Guandú e Colatina, as aulas das redes de ensino estadual e municipal foram interrompidas. Em Linhares, cidade que capta água de outro manancial em época de baixa do Rio Doce, como a atual, foi construída uma barragem para impedir que a lama trazida pelo Rio Doce contamine esse manancial, de acordo com autoridades locais.
Do Portal Vermelho, com informações de Agências
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