A edição da revista Veja que chegou às bancas em 3 de abril de 2010 dedicou três páginas em espaço de destaque de entrevistas da publicação, chamado de páginas amarelas, ao atual senador Aécio Neves (PSDB-MG). Foi uma entrevista em que todas as perguntas eram elogiosas ao tucano, e sob medida para atacar os principais adversários políticos. Observando o texto, nota-se que o objetivo era a promoção da candidatura de Aécio ao Senado naquele ano.
O subtítulo começou com um conveniente anúncio político: “O tucano Aécio Neves confirma que concorrerá ao Senado (…)”. O uso da palavra anúncio pode ser empregado mais no sentido de propagandear do que de novidade jornalística, já que desde dezembro do ano anterior o tucano repetia em todas as declarações e entrevistas que se candidataria a senador.
O que a revista e o entrevistado não informaram ao distinto público é que uma semana anterior o tucano, ainda no cargo de governador, promoveu uma farra aérea com dinheiro público do contribuinte de Minas Gerais para o casal Roberto Civita, dono da revista, falecido em 2013 – que teve até a presença de Aécio chorando no enterro.
No final de semana de 27 e 28 de março de 2010, o então governador Aécio deu o helicóptero oficial do Estado de Minas exclusivamente para levar Roberto Civita e sua mulher de Belo Horizonte a Brumadinho, para o casal passear visitando o museu de Inhotim.
Após esse passeio, Aécio ciceroneou o casal de amigos em outro passeio a São João Del Rey, em outra aeronave oficial do governo mineiro, um jatinho Learjet. No domingo (28), o casal Civita voou no helicóptero oficial de volta ao Aeroporto Internacional de Confins. No sábado seguinte, dois jornalistas da revista assinaram a entrevista com o então candidato ao Senado.
Imagine se um diretor da Petrobras durante um governo petista emprestasse um avião da empresa, pago com dinheiro da empresa, para um empresário de mídia passear e depois ganhasse uma simpática entrevista na semana seguinte ao se lançar candidato a um importante cargo eletivo? Como os investigadores da Operação Lava Jato tratariam o caso?
A troca de gentilezas às custas do erário, o toma-lá-dá-cá, seria criminalizado, tratando-o como vantagem indevida?
Se não fosse Aécio, se não fosse tucano, e se não envolvesse a revista Veja, é bem possível que, no mínimo, fosse aberta uma investigação e um processo para ressarcir os cofres públicos com o dano causado ao erário.
Em vez disso o que vemos é o filho e sucessor de Roberto Civita, Giancarlo Civita anunciando que abrirá a palestra do juiz Sérgio Moro na Associação Nacional dos Editores de Revistas.
Por ironia, Aécio disse na entrevista à Veja: “Os gregos diziam que a política é a amizade entre vizinhos. Quando traduzimos para hoje, estamos falando da capacidade de construir, com alianças, o bem comum”. Parece que Aécio levou bem a sério a política de “amizade” e aliança com os empresários de mídia, e o bem comum aos interesses empresarias e políticos de ambos.
Para quem não conhece o negócio de mídia, é comum empresas do setor fazerem permuta de anúncios em troca de serviços. Exemplo: um plano de saúde, em vez receber pagamento em dinheiro por um plano empresarial para os funcionários da empresa, troca por anúncios.
Escondido por trás da liberdade de expressão assistimos permutas constantes entre empresários de mídia e políticos. Bons negócios para empresários de mídia com recursos públicos aparecem refletidos na forma de uma linha editorial simpática a quem os atendem.
Antes do mensalão do DEM, o ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda também teve uma entrevista laudatória nas páginas amarelas da revista Veja logo após fazer assinaturas em massa da publicação para escolas estaduais. O governador Geraldo Alckmin também adotou esta prática de comprar assinaturas em massa tanto da revista Veja como de outros jornais e revistas da imprensa tradicional para escolas estaduais. Conta com uma blindagem editorial que sempre preserva sua imagem política, mesmo diante de escândalos de corrupção do tamanho do metrô paulistano, que afeta milhões de pessoas todo dia, mesmo diante de fracassos administrativos gritantes como o que levou ao racionamento de água não oficializado, e mesmo diante de decisões catastróficas para o futuro de gerações como fechar escolas estaduais e superlotar salas de aula.
O autor do livro “A privataria tucana“, o jornalista Amaury Júnior, em um debate sobre o livro foi perguntado sobre novos projetos de jornalismo investigativo e disse ter tomado conhecimento de que havia governadores que incluíam nas negociações de incentivos fiscais para indústrias acordos informais para as empresas anunciarem na imprensa “amiga”.
Hoje os veículos de mídia tradicional, em crise, se reposicionam para fornecer conteúdo jornalístico pago. Isto é, fazer matérias com a cara de reportagem, porém encomendadas por anunciantes visando atrair consumidores para seus produtos. Dizem os veículos que tais matérias terão aviso ao leitor que se trata de matéria paga.
Seria bom que a Justiça Eleitoral obrigasse que matérias políticas pagas com favores também fossem incluídas aí com honestidade e transparência. E que fossem contabilizadas nas prestações de contas dos respectivos partidos em vez pendurar nos cofres públicos.
Fonte: Helena Sthephanowitz, RBA
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