Apesar de fundamental na dinâmica camponesa, o trabalho da mulher não é valorizado, nem remunerado e tampouco visto como esforço, mas como algo natural. Sem remuneração e com baixa escolaridade, ela fica em posição de subordinação ao marido.
Precisamos falar sobre o empoderamento das mulheres rurais de baixa renda. Na década de 1980, os movimentos de mulheres rurais ganharam força, culminando na primeira Marcha das Margaridas, no ano de 2000. Durante as Marchas das Margaridas, uma pauta de reivindicações é entregue ao governo federal para negociações.
Neste ano, a V Marcha das Margaridas teve como pauta a visibilidade da mulher no campo em aspectos econômicos, políticos e sociais, o desenvolvimento rural sustentável, a violência contra a mulher, acesso à educação e igualdade dos sexos.
O campo é um espaço com uma divisão sexual do trabalho bastante evidente. Enquanto homens são responsáveis pelo trabalho produtivo, que resulta em ganhos monetários, as mulheres ficam responsáveis pelo trabalho reprodutivo e tudo o que está ligado ao ambiente interno da casa.
Apesar de fundamental na dinâmica camponesa, o trabalho da mulher não é valorizado, nem remunerado e tampouco visto como esforço, mas sim como algo natural, que praticamente emerge da natureza da mulher.
A ausência de remuneração coloca a mulher em uma posição de subordinação ao marido, o que se reflete nas decisões dentro de casa e sobre sua própria vida. Em busca de evitar a subordinação, a mulher procura o trabalho externo, menos valorizado que o trabalho do homem por se tratar de atividades mais simples.
Com a iniciativa feminina de trabalhar fora de casa, dá-se início à dupla jornada de trabalho, soma-se trabalho interno e externo, com a remuneração apenas do primeiro e a invisibilidade do segundo.
A busca de um trabalho de melhor qualidade vem por meio de políticas rurais como assistência técnica, crédito rural, ou por meio da união em trabalhos conjuntos, utilizando como ferramenta principal de trabalho as mãos.
Ainda que o governo contemple as mulheres com programas de financiamento, assistência técnica e documentação civil básica, como empoderar estas mulheres sabendo que lhes falta estudo, acesso à saúde e a proteção contra a violência?
A dependência de um marido ainda é presente, segundo dados do Censo Agropecuário de 2006. Do total de agricultores familiares, apenas 14% dos chefes de família são mulheres. Sendo entendido como chefe de família aquele que produz, reforça-se a invisibilidade do trabalho de grande parte das mulheres.
Os serviços de assistência técnica, como o próprio nome diz, são técnicos, sem uma linguagem apropriada e muitas vezes divididos entre assistências de homens ou de mulheres visto os assuntos e a forma como são tratados. A divisão de gênero nos trabalhos é bastante clara, as opções para as mulheres são ligadas ao trabalho manual, ficando à margem do trabalho com máquinas, mais valorizado.
Para o incentivo à produção, há uma linha específica do crédito do Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) voltada para mulheres. O Pronaf visa a apoiar o desenvolvimento rural da agricultura familiar, podendo ser financiadas atividades agrícolas e não agrícolas.
O Pronaf destina 30% dos recursos ao Pronaf Mulher, mas esse número esse ainda não atingido, devido ao preconceito de operadoras de crédito, a burocracia ou a falta de documentos básicos como o Cadastro de Pessoa Física (CPF) e o Registro Geral (RG). Por esses motivos, quem mais tem dificuldade no acesso ao crédito são as mulheres mais pobres.
Ao decidir trabalhar fora de casa para obter remuneração, é preciso também lidar com a dupla jornada ao cuidar da casa e dos filhos. Quando os filhos são grandes, podem ajudar no trabalho ou estudar, mas enquanto pequenos, é preciso a atenção da mãe dificultando o acesso ao trabalho remunerado. Para isso, são necessárias creches em tempo integral.
Além disso, a baixa escolaridade dessas mulheres está atrelada ao desconhecimento de direitos e de políticas públicas ou mesmo à dificuldade em lidar com o dinheiro, seja crédito ou não, e na implantação de objetivos. Objetivos esses muitas vezes comuns a toda a família, não necessariamente relacionados aos objetivos pessoais da mulher.
Ao pensarmos em empoderamento monetário, devemos pensar também no empoderamento social como uma forma de igualar homens e mulheres em todos os aspectos.
Não olhar apenas para agricultoras como trabalhadoras que precisam garantir seu sustento ou o da família, mas olhar como mulheres que precisam de direitos sociais e que as tarefas dentro e fora de casa possam ser divididas igualmente entre todos.
Proteção à mulher, licença e auxílio-maternidade, o acesso a terra, a garantia de saúde e da educação pública, condições que facilitem a vida no campo (moradia, saneamento, luz, estradas), a participação política da mulher, todos esses pontos devem ser assegurados não apenas no plano da política pública, mas na efetividade da ação.
Por meio do empoderamento social, pode-se garantir um maior e melhor empoderamento econômico de mulheres rurais.
*Tamara Quadros é graduanda de Gestão Pública para o Desenvolvimento Econômico e Social da UFRJ e ex-estagiária do Incra.
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