terça-feira, 10 de novembro de 2015

BRASIL: 'NÃO DAREI NENHUM PASSO PARA TRÁS'


Gils Garbo insiste que foi aprovada por 90% dos senadores e que sua remoção só é permitida através dos procedimentos marcados pela Constituição.

Ela não se mete em prognósticos eleitorais, mas responde “não” quando a pergunta é se renunciará por eventuais pedidos de Macri, de Scioli e da própria Cristina Fernández de Kirchner. Numa entrevista com o jornal Página/12, a procuradora perante a Corte Suprema reivindicou o crescimento institucional do cargo e sua articulação em questões como o combate aos líderes do narcotráfico, e explicou porque não desistirá do seu desafio.

– Dirigentes e candidatos de Cambiemos (“Mudemos”, coligação opositora) pedem que, se Macri ganha as eleições do dia 22, você deixei o cargo.

– Querem que eu renuncie.

– Sim.

– Mas eu não vou deixar o cargo.

– Não seria o correto politicamente uma renúncia ao cargo de procuradora?

– Não, e por distintos motivos, que são institucionais e constitucionais.

– Quais são os institucionais?

– Há um processo em marcha dentro do Ministério Público, que, sem dúvida, não depende somente de mim, mas de centenas de pessoas. Todas estão comprometidas com a construção de um MP diferente. São pessoas que trabalham muito e arriscam suas vidas enfrentando a criminalidade organizada, que inclusive colocam em risco a segurança de suas famílias. Eu encabeço o projeto de transformação e de construção de uma melhor ferramenta, não é um projeto pessoal. E por isso existe um segundo tema: as funções do MP são determinadas pela Constituição.

– Chegamos às razões constitucionais para não abandonar o cargo.

– É que isso prejudicaria a instituição e faria desandar um caminho de reforma constitucional que vem desde 1994. A nova constituição estabeleceu que o Ministério Público teria autonomia. Que seria uma engrenagem do sistema republicano. É simples: se trata de desenhar e cumprir os contrapesos entre os poderes. A constituição é clara a esse respeito. Por isso, não pode provocar minha renúncia.

– Por que não?

– Porque a renúncia de quem encabeça a Procuradoria não é um ato que figura entre os atos de quem se coloca à disposição do Poder Executivo.

– Mas você não é uma ministra.

– Segundo a Constituição, o Poder Executivo é unipessoal, e quem o exerce designa seus colaboradores. Não é o meu caso, porque o Ministério Público não integra o Poder Executivo, tampouco o Legislativo ou o Judiciário. A Constituição é fruto de um processo histórico, de conquistas sociais. Querem que apaguemos as conquistas de toda a sociedade? Seria surpreendente que aqueles que defendem a institucionalidade e a independência da administração da Justiça digam agora que eu tenho que entregar o cargo porque poderia haver mudança de governo. Me faz recordar outras épocas, quando os que esgrimiam o discurso da proteção da constituição terminaram arrasando com a constituição e os direitos humanos. Quer dizer que aqueles que falam de institucionalidade não acreditam nela? Eu não vou renunciar, porque quero seguir construindo um Ministério Público cada vez mais sólido. Se há quem imagine outra saída pode prestar atenção à constituição e verá que o procedimento de remoção da procuradora é o mesmo que para qualquer ministro da Corte Suprema. Precisa ter dois terços dos votos do Senado. Por isso, não só tenho o direito de não renunciar, tenho o dever de não renunciar. De outra forma, estaríamos retrocedendo em avanços constitucionais alcançados em benefício do Estado de direito.

– O critério de não renunciar se mantém se o vencedor do primeiro turno, Daniel Scioli, revalida sua vitória no segundo?

– Com certeza, eu mantenho o mesmo critério. Repito: não vou abandonar o cargo.

– E se o pedido de renúncia viesse por parte de Cristina Kirchner? Poderia fazê-lo como ex-presidenta e líder política, governista ou da oposição, ou como chefa de um setor político diferente dentro dos que governam a Casa Rosada.

– De novo: não vou renunciar. Só vou deixar o cargo quando considere que cumpri um ciclo, e que pode haver uma renovação favorável à instituição. Vim para transformar as estruturas do Ministério Público, que trabalhava como um simples espelho do Poder Judiciário. Não começava investigações, não tinha os planos de aperfeiçoamento e articulação nacional e provincial, como já mostramos que somos capazes de fazer. Tampouco existiam os programas especiais que permitem o acesso à Justiça nas periferias de Buenos Aires, em Mendoza, em Mar del Plata, em Rosario. Todo esse esquema de articulação permitiu ao MPF trabalhar de forma eficaz em grandes causas de narcotráfico, por exemplo. Obtivemos condenações na Operação Carvão Branco. A Procuradoria sobre Narco Criminalidade realizou a denúncia contra o juiz Raúl Reynoso. Antes, não havia uma estrutura desenhada para cruzar informações. E cruzar informações é essencial para enfrentar o crime organizado. O habitual é que fossem presos os caminhoneiros e outros intermediários. Mas ninguém investigava os donos dos caminhões. Isso mudou. Agora buscamos também os donos, e depois quem mais seja responsável.

– A questão do narcotráfico foi bastante abordada durante a campanha eleitoral, embora não tenha sido discutida necessariamente a questão do combate aos grandes narcos. Qual é a avaliação da Procuradoria em geral?

– Que se está avançando. Antes, a Procuradoria não possuía uma unidade especializada em narcotráfico. Com a criação da Procunar (Departamento especializado em narcotráfico, ligado à Procuradoria), o trabalho com os promotores levou a que se chegasse aos cabeças das quadrilhas. As províncias articularam. Temos unidades de informação conjunta em Salta, em Mar del Plata, em Rosario, e com isso pudemos prender alguns chefes de quadrilha. Esta é a forma de trabalhar, com o Estado colaborando em todas as esferas, nacional, provincial e municipal, tornando mais eficaz a investigação. Claro que nada disso funciona completamente sem políticas públicas e sem acesso à Justiça, e por isso instalamos centros de atenção nos bairros da periferia. Para que seja o Estado que dê a proteção às pessoas que antes não tinham um canal para denunciar a violência policial ou a violência de gênero. Pessoas que estavam condenadas, porque não tinham meios econômicos ou culturais. Disso se trata a construção institucional. Às vezes parece que não estamos acostumados às instituições, mas precisamos reivindicar o autocontrole no seu sentido republicano. Se cada presidente vai colocar alguém da sua confiança independente dos tempos, como pode haver respeito pelas instituições? Eu fui eleita com os votos de 90% dos legisladores presentes. Suponho que a minha trajetória de vinte anos no Ministério Público jogou a meu favor nessa escolha.

– Uma das acusações contra você diz que supostamente professa um governismo extremo.

– Posso concordar com algumas políticas públicas, mas nunca tive filiação partidária.

– Outra acusação é a de que se tornaria, no futuro, uma aliada do kirchnerismo em processos que tenham a ver com casos de corrupção de funcionários do atual governo.

– Os jornais informam sobre a atividade dos promotores exigindo atuações por denúncias de corrupção com plena autonomia e liberdade. Mais que pressionados, nós somos vistos em ação, com plena independência de critério, como atuou o promotor Alberto Nisman, lamentavelmente falecido. Ou como mostrou-se no processo contra o vice-presidente Amado Boudou, ou as investigações sobre o general César Milani. E sobre as inspeções feitas nas penitenciárias? Esse é um projeto institucional sério.


Fonte: Carta Maior

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